Academia Almadense – Uma Casa com Tradição 

Espaço de longa tradição, a Academia Almadense continua a escrever a sua história de 124 anos no concelho de Almada.

Tudo começou com “a menina dos nossos olhos”, como se refere à Banda Filarmónica, Vítor Pinto Claro, presidente da direção da Academia Almadense há três anos. A sua vida está há muito ligada a esta colectividade, tendo sido durante 11 anos director da Ginástica e vice-presidente Desportivo. Actualmente este cargo está à responsabilidade de Carlos Piedade, que colabora com a Academia desde 1979 e também participa nesta conversa.

Antes do presente, claro, há o passado, uma história que começa em 27 de Março de 1895, quando nasce a Academia de Instrução e Recreio Familiar Almadense, no Largo 1º de Maio, em Almada. José Maria de Oliveira, comerciante e músico amador, que já havia sido tanoeiro de profissão, funda com amigos a Academia e é o seu primeiro presidente.

A construção da sede, na Rua Capitão Leitão, foi concluída em Setembro de 1942. No entanto, com o passar dos anos, o edifício já apresentava sinais evidentes de degradação que exigiram uma reabilitação profunda de toda a construção. A requalificação desta sede, onde hoje nos encontramos, foi inaugurada a 13 de Setembro de 2014, e a partir dessa altura passou a albergar também a Companhia de Dança de Almada (Ca.DA), com base num protocolo celebrado entre as duas instituições que permite à Ca.DA dispor do auditório da Academia.

124 anos depois

Em Março, a Academia Almadense celebrou as suas 124 primaveras. Para comemorar a data, elaborou um programa, aberto a toda a população, que decorre até 5 de Maio, e que inclui uma revista musical, teatro comunitário, noite de
fados, mais, no dia 6 de Abril, o espectáculo Canta Zeca, Canta Adriano, Cantamos Nós, que junta vários convidados musicais em homenagem aqueles dois compositores e intérpretes.

Vítor Pinto Claro também quer marcar pela diferença este ano, “temos uma abertura, ‘Almada tem talento’, para a qual convidámos 10 colectividades do concelho a fazerem uma apresentação à sua escolha. Por nós escolhemos uma representação inédita: uma jovem de 12 anos a tocar violino com outra criança a dançar capoeira. É um contraste e vamos apostar nisso”.  Ainda no que diz respeito à música, destaca-se, a 7 de Abril, um encontro de bandas com a Banda da Sociedade Filarmónica Operária Amorense e a Banda da Timbre Seixalense. E no dia 13 de Abril, no Complexo Municipal dos Desportos, no Feijó, decorre o XXV GymnaAcademia, um evento anual com participação de várias coletividades vindas de fora do concelho, todas elas ligadas à ginástica rítmica.

Cultura e Desporto 

A Academia Almadense tem cerca de 4500 sócios. Quem pratica actividades culturais e desportivas não tem a obrigatoriedade de ser associado, mas pagando uma quota, tem regalias como descontos nos preços.

A nível cultural, existe o teatro musical, que conta com quatro professores, e é um curso que pretende desenvolver capacidades de canto, dança e representação, que serão aplicadas num espectáculo no final da época. Existem ainda as aulas de violino, piano, viola e de teatro.

Por seu lado, a Escola de Música da Banda tem como objectivo principal formar músicos, que posteriormente irão integrar a filarmónica. Francisco Pinto é o maestro da Escola de Música da Banda, que vamos encontrar concentrado a trabalhar no espaço onde decorrem estas aulas. O presidente da Academia Almadense tece-lhe fortes elogios: “o nosso maestro tem feito um trabalho fantástico, todos os anos consegue levar da Escola de Música à Banda Filarmónica quatro, cinco executantes”. O que é importante, já que grande parte da história desta colectividade se deve à actividade musical. “Temos uma grande banda, à volta de 36 elementos”, orgulha-se Vítor Pinto Claro. Quando solicitada, participa em encontros e desfiles de bandas filarmónicas, assim “como nós também convidamos outras instituições com bandas a virem à Academia”. No programa de aniversário anual é já tradição acrescentar uma de representação a nível nacional, seja a banda do Exército, a banda da Marinha ou a banda da Aviação.

A nível desportivo, a acção acontece no ginásio da Academia Almadense. Existem classes de formação dos três aos nove anos, que vão evoluindo de forma a integrarem as classes de representação. A ginástica rítmica, uma das modalidades mais antigas da colectividade, e a acrotramp, classe de acrobacia, também são motivo de vaidade para Vítor Pinto Claro. “Temos duas classes de representação, a nível nacional e internacional, que, de quatro em quatro anos, participam no Gymnaestrada”, o maior evento de ginástica competitiva mundial. E é neste contexto, que a Almalusa, a classe de ginástica rítmica, vai à Áustria, em Julho.

Com foco na ginástica sénior, existe a classe de manutenção que oferece um espaço de treino àqueles que desejam manter-se saudáveis e activos. Aqui também são praticadas artes marciais judo e karaté com classe jovem e adulta, kung fu, tai chi e chi kung, e com o metre Didi há aulas de capoeira.

 

Sala de Cinema

A Academia Almadense tem a maior sala de espectáculos de Almada, com 830 lugares, “o Salão Nobre” como lhe chama o presidente. Inaugurada em 1974, serve de palco aos espectáculos promovidos pela Academia e pode ser alugada por entidades externas para eventos. “Quando nos solicitam as nossas instalações, nós facultamos sempre, cedemos a sala grande para as festas de Natal das coletividades e empresas. Em Dezembro está muito ocupada porque ao nível do concelho não há igual”, reconhece o Presidente da AIRFA.

Foi a esta sala, no final de 2018, que a iniciativa Feliz Almada, trouxe Bruno Nogueira com o espetáculo de stand up Depois do Medo, e Ricardo Araújo Pereira. “São sempre casa cheia! Vasco Palmeirim, António Raminhos, todos esses têm vindo cá e ao longo do ano ainda temos espectáculos que fazemos consoante a Câmara Municipal de Almada solicita as nossas salas, como acontece com o Concerto de Ano Novo.” Carlos do Carmo, Sérgio Godinho, Trovante, Fernando Tordo, Raquel Tavares, Xutos e Pontapés são alguns dos artistas que, nos últimos anos, passaram pela sala grande. “O Paulo de Carvalho adora vir à Academia, diz que não há casa com uma acústica como esta”, reforça o Presidente.

Também o Tágides – Festival Internacional de Tunas Universitárias, da FCT Nova, que acontece em Março, é uma tradição nesta casa desde há 26 anos.

Mais importante é a Academia Almadense e o seu cinema fazer parte da memória comunitária, sendo esta a sala onde muitos viram cinema pela primeira vez nas suas vidas. Vítor Pinto Claro recorda esses tempos áureos: “o cinema funcionava aqui em pleno, com as salas sempre cheias, até faziam fila. Tínhamos acordos com a Columbia Pictures, Castello Lopes e Lusomundo, que deixou de nos distribuir as estreias, porque com o aparecimento do Almada Fórum, foi lá que as pessoas passaram a ir ao cinema”. Em 2006, a AIRFA suspendeu mesmo a exibição de filmes, pois já só tinham prejuízo.

Actualmente, são exibidos filmes apenas enquadrados na programação da colectividade. O CineEco Almada é um festival de cinema dedicado às crianças, que decorreu no início de Março. A Monstrinha, outra iniciativa da Academia Almadense, também por aqui passa em Abril. “Passamos filmes englobados no Festival da Juventude, e durante as comemorações do aniversário também são exibidos para os associados, tudo de forma gratuita”.

Existe ainda o Cine Teatro 2, uma sala mais pequena, com 197 lugares, restaurado em 2014, que também pode ser requisitado.

Nova requalificação e financiamentos da CMA 

Mas como diz o ditado, “quem está no convento é que sabe o que lá vai dentro”. E relativamente a este assunto, Pinto Claro defende aquela que “é a sala que nós merecemos dentro do nosso concelho e que tem de ser toda requalificada. No Cine Teatro 1, é necessária intervenção e de forma urgente. Tem sido feita a inspeção por lei, e com a revisão já nos alertaram para a intervenção que aqui temos de fazer”. “Se nós Academia, necessitamos deste espaço restaurado, a Câmara Municipal de Almada também necessita, porque o utiliza muitas vezes durante o ano, e só não dispõe mais porque não estão reunidas todas as condições”. E o presidente enumera algumas das mudanças necessárias: “o ar condicionado não está a funcionar, o palco precisa de ser restaurado, tem de levar varas motorizadas e uma cortina antifogo, que, para se ter uma ideia, só a cortina custa à volta de 50 mil euros. A sala de cinema também tem de levar cadeiras novas, a alcatifa lateral e do chão é toda para ser levantada, colocar-se uma insonorização diferente, os camarins precisam de ser renovados, que estes estão mais do que ultrapassados. Também já nos é exigido um elevador, assim como uma casa de banho para deficientes no piso inferior”.

Obras que ascendem a um milhão e meio de euros e estão dependentes da CMA, que as aprovou, mas que até à data nada executou e neste momento vive-se um impasse.

Vítor Pinto Claro contextualiza como decorreu este processo. “Na altura, com o presidente Judas, mediante um protocolo, a câmara deu-nos uma verba e ficou pendente um valor para quando fosse o restauro da outra parte do edifício. Numa reunião que a Direção da AIRFA teve com a actual presidente, falou-se que a obra envolve entre 1 milhão e 200 mil a 1 milhão e 500 mil. A presidente disse-nos que até dois milhões não haveria problema, e que até ao final do seu mandato queria a obra toda concluída, que tal não poderia ser numa única fase, mas que se fazia em duas ou três. Posto isto, avançámos com o arquitecto José Luís Amaro, que já havia feito o projecto deste edifício com o elevador, aqui já com a sala da banda, a sala do associado e o museu no rés do chão para serem espaços que passem a ter visibilidade e a dignidade que os associados merecem.”

Este arquitecto acabou por falecer, por isso “tivemos de encontrar um outro, Carlos Alberto Gomes, que nos fez o projecto entregue e aprovado pelos serviços técnicos da CMA. Isto passou-se há cerca de um ano e continuamos a aguardar. A presidente diz-me que as obras se fazem”, mas nada avança. É de reforçar que em causa não está apenas a estética, mas principalmente as questões de segurança inerentes a um espaço frequentado pela população. Tal como admite o presidente “queria realmente que esta obra fosse concluída para que a Academia tenha a distinção que Almada merece, que possa ser utilizada por nós, por todos os que nos solicitam a cedência da sala e pela própria CMA, que dela usufrui”.

Câmara, aliás, que, pelos serviços prestados à comunidade, atribuiu à Academia Almadense a Medalha de Ouro da Cidade, em 1995. ”A importância do reconhecimento é o valor que esta coletividade tem dado em prol do movimento associativo ao concelho e a nível nacional. É de utilidade pública pois promove o desenvolvimento intelectual e físico dos cidadãos”.

Além do financiamento pontual já referido para obras, existe um protocolo celebrado entre a Academia Almadense e a CMA, que já vem dos executivos anteriores, com os ex-presidentes Maria Emília de Sousa e Joaquim Judas. Até às últimas eleições autárquicas “este valor foi de 48 mil euros, distribuído por parcelas quadrimestrais, mas com a presidência da autarquia entregue a Inês de Medeiros baixou para 43 mil euros. Este ano, estamos a negociar para que volte novamente para os 48 mil euros, como era anteriormente”.

“Para mantermos os ordenados dos trabalhadores em dia este apoio é fundamental, temos aqui muita gente a trabalhar, além do maestro e dos professores das área cultural e desportiva, que envolvem um valor muito elevado, e para isso necessitamos mesmo da colaboração da própria autarquia, quer a CMA, quer a Junta de Freguesia.

Ao cima das escadas do cinema, inaugurado a 6 de Novembro de 1974, encontra-se um painel, que simboliza a história da Academia Almadense, projectado pelo escritor e dramaturgo Romeu Correia e executado por Louro Artur. Entretanto, como todas as terças-feiras, no piso inferior, a cooperativa Fruta Feia entrega os cabazes de fruta e
legumes aos seus consumidores no concelho.

O museu José Maria de Oliveira, situado no último piso do edifício, tem em exposição todo o património da AIRFA, embora não seja visitado. O objectivo é transferi-lo para o rés de chão para não ficar esquecido. “O nosso museu é lindo e riquíssimo, digno de ser visto, até pelas escolas”, enaltece o presidente. E parece de facto impossível não sorrir quando os olhos se passeiam por tal herança, desde fotografias a preto e branco, instrumentos antigos e até relíquias, como o primeiro telefone de parede da colectividade.

Sinais dos tempos, que se vão alterando. Por admirar ficou a vista do terraço que tanto prometia. A Academia Almadense faz parte da memória colectiva da cidade: se uns ainda recordarão os tempos do cinema ao ar livre, ou os bailes de domingo à tarde no salão, possivelmente palco de histórias de amor, outros estarão hoje mais preocupados em tocar a nota certa na banda filarmónica ou em dar um salto mais perfeito na ginástica rítmica.

Esta é uma casa almadense, com certeza!

Para saber mais em http://www.airfa.pt/

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