A Meta

Foi publicada uma reportagem da autoria de Mário Alexandre Borges no Blog “A Vídeo Mania” sobre A Meta, a casa de diversões da Rua dos Pescadores que fez as delícias da criançada, e não só, durante décadas a fio e ainda lá está… Como o Notícias da Gandaia tem feito em casos semelhantes, republica aqui o texto na sua íntegra, mas aconselha os leitores a lerem no original (CLIQUE AQUI PARA LER).

 

José dos Santos até seria um homem completamente comum, não fosse a sua paixão pelo mundo do vídeo. Há 30 anos que mantém um negócio apaixonante mas arriscado no mundo dos clubes de vídeo, no qual tem sido um autêntico “sobrevivente”.

Mas a sua história veio a tornar-se ainda mais rica quando em 2013 recebeu uma herança muito especial, do seu falecido pai, também ele chamado José. Um antigo salão de jogos, na Rua dos Pescadores, na Costa da Caparica. É conhecido internacionalmente e tem sobrevivido ao longo dos anos de uma forma, diria, se me permitem: “castiça”. «O negócio de diversão veio parar-me às mãos um pouco por obrigação, visto que foi uma herança deixada pelo meu pai, que faleceu há dois anos. Foi ele que criou e manteve o salão de jogos durante cinquenta anos.»

O “menino dos olhos” de José dos Santos (pai) acompanhou-o durante toda a vida. Foi quase como que uma forma de estar, uma missão que levou até aos últimos dias. «O meu pai vivia muito este salão. Dedicou-se a ele até aos 92 anos, altura em que deixou de ter forças e acabou depois por falecer.» 

Ao seu lado José tinha um fiel empregado, um homem de completa confiança que dedicou, igualmente, toda a sua vida à ”causa” do salão. «O senhor Carlos foi um tipo de empregado que é raro encontrar nos dias de hoje. Um homem muito fiel, dedicado e grato ao meu pai. Diria até, que mais do que um empregado, foi um amigo que o meu pai teve. Faleceu também há pouquíssimo tempo, com 93 anos. Na época tive de o obrigar a ir para casa, porque mesmo muito doente mantinha-se religiosamente ao serviço, diariamente. Às vezes penso que foi a falta do salão que o levou mais rapidamente.» 

A memória vai traindo José dos Santos, e sem recurso a documentação que mantém religiosamente arquivada, acabou por, através de um calculo mental, chegar ao ano da inauguração do salão de jogos “A Meta”. Na época José era apenas uma criança e guarda com grande ternura e entusiasmo o grande projeto da vida do seu pai. «O salão foi inaugurado pelo meu pai em 1962. Eu na época era um miúdo e para mim o negócio do meu pai era uma autêntica Disneylândia. Eu vibrava imenso com todas aquelas máquinas e diversões. Era um outro mundo que me proporcionou uma infância com experiências muito boas.»

Antes da conversa com o José, estava longe de imaginar o porquê do nome “Meta”. Mas agora tudo faz muito mais sentido.«Cedo este salão tornou-se muitíssimo conhecido, quer a nível nacional, quer internacionalmente. Talvez não saiba a razão, mas o nome “Meta” vem justamente da primeira atração desta casa: as quatro pistas de carros telecomandados que o meu pai aqui tinha. Muitos estão longe de imaginar a loucura que eram as corridas e torneios que aqui se faziam nas décadas de 60 e 70. Havia um campeonato a nível nacional que era disputado em várias pistas de norte a sul e a Meta era um local de paragem obrigatória para disputar jornadas. Foi essa a razão pela qual o meu pai resolveu chamar “Meta” ao salão de jogos que antes não tinha um nome específico.» 

Ainda hoje, há quem pergunte pelas pistas, que já há duas décadas foram retiradas por uma questão de logística. «Passados mais de vinte anos de termos retirado as pistas, ainda há pessoas que aparecem por aqui e perguntam: “então mas e onde é que está a pista”? A maioria são pessoas que não vêm à Costa há alguns anos e que queriam muito mostrar aos filhos e aos netos as pistas que marcaram as suas infâncias e juventude.» 

A tecnologia avança ferozmente, e José acompanhou muito bem isso no que toca aos jogos. Mas tudo teve o seu começo. «No início as máquinas ainda eram algo rudimentares. A maioria funcionava com sistemas mecânicos. Exemplo de máquinas desse tempo é o famoso jogo do basquete, e ainda os tiros aos aviões, uma máquina que funcionava a bobines que fazia um barulho enorme a trabalhar. E depois tínhamos os clássicos matraquilhos e o snooker, que eram procurados por miúdos e graúdos.»

A família de José poderia agora estar bem mais rica, em todos os sentidos, se tivesse guardado todas as relíquias que figuravam no salão nas primeiras décadas. «Infelizmente não tenho um espólio com as antigas máquinas do meu pai. Porque as máquinas antigas foram gradualmente substituídas por outras mais recentes e a falta de espaço fez com que me fosse livrando de muitas delas. Hoje todos nós temos uma outra forma de olhar para a história e para a importância das lembranças do passado e arrependo-me de ter deitado algumas daquelas relíquias fora. Até porque conheço muitos colecionadores que têm milhares de máquinas destas, e que atualmente estão altamente valorizadas.» 

Mas existem exceções há regra, tais como antigas máquinas de contar moedas, alguns quadros de clubes portugueses de futebol, que na época também faziam torneios de dardos e uma raridade que José guarda numa velha arrecadação. A “Balança dá Bónus”, uma máquina fabricada no Barreiro e que tem mais de 50 anos.

A primeira grande revolução surgiu nos anos 80, com o advento das máquinas de arcada. Os jogos deixaram de ser jogados mecanicamente para serem jogados através de vídeo. «Depois foram surgindo inovações e os primeiros jogos de vídeo. O Space Invaders ou Pac Man foram grandes revoluções da época. A partir desses jogos as coisas começaram a evoluir cada vez mais rapidamente e o salão começou a encher-se de máquinas cada vez mais competentes.» 

Entre os clássicos mais recentes que o salão apresenta, um dos casos de maior sucesso são os simuladores. O mais concorrido é sem dúvida o Daytona, um simulador de corridas de automobilismo que faz furor entre várias gerações. «O Daytona realmente é um caso de sucesso na história dos vídeo jogos e sobretudo dos simuladores. É procurado por pais, filhos e avós. Já tenho visto crianças de quatro anos ao colo dos pais a jogar e senhores idosos que também ainda fazem umas curvas. As máquinas que aqui temos já têm mais de vinte anos e tem sido um esforço imenso manter esse jogo vivo, visto que já não há material e posso agradecer à equipa de técnicos com a qual trabalho a manutenção daqueles simuladores.»

Os tempos mudam e infelizmente para o salão de jogos “A Meta” as vontades também. As inscientes que figuravam naquele mítico espaço da Costa da Caparica, têm sido gradualmente substituídas por um vazio desconcertante. «Durante o inverno a frequência é mínima e é difícil gerir essa situação, pois as despesas com eletricidade e manutenção são cada vez mais altas, principalmente se vermos que grande parte das máquinas que aqui estão já não são fabricadas nem têm peças para possíveis arranjos.»

Para tentar fazer face aos custos José já teve de fechar um dos três pisos do salão, que anteriormente era destinado ao snooker. O cenário é triste, mas necessário para a manutenção do negócio. «Condensei o snooker todo no piso de baixo e assim poupo eletricidade e preciso de menos um funcionário para guardar este piso.»

Mas José não desiste e acredita sempre que é possível chegar ao verão seguinte. No verão as coisas são diferentes. A casa enche quase todas as noites. É aí que o negócio consegue ter o seu retorno. «O grosso dos nossos visitantes vem de fora. A Costa da Caparica continua a ser um local muito visitado no verão e os turistas nacionais, mas principalmente internacionais, enchem a casa com o entusiasmo de outros tempos. A maioria é francesa.»

Para registo fica a emoção com a qual José ainda fala do salão e a esperança que tem nas novas gerações para a manutenção de casas como a sua. «É engraçado, hoje com toda a evolução informática e com jogos cada vez mais realistas e sofisticados ainda há quem prefira jogar em simuladores, pois apesar de estarem atrás a nível tecnológico a jogabilidade é muito mais real e a emoção também. Isso vê-se nas crianças, que deixam os tablets com os pais e vão a correr para as máquinas e os simuladores com sorrisos enormes. Os tempos mudaram mas a emoção que via nos rostos dos concorrentes das corridas mantém-se e continua a haver lugar para a diversão.»

 

Notícias da Gandaia

Jornal da Associação Gandaia

One thought on “A Meta

  • 19 de Maio, 2018 at 21:21
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    A Meta ou “Mini Pista”, como a malta das “barracas” lhe chamava,fez parte da minha juventude e conheci bem o Sr.Santos,pai do actual proprietário.
    Quantas partidas de matraquilhos aí fazíamos (umas a apostar outras não),sob o olhar atento do “Trafaria”, um dos primeiros empregados da casa, a quem muitas vezes ajudei a varrer o espaço quando por volta da meia noite ele encerrava. Mas nesse tempo era sempre “casa cheia”, e mesmo no Inverno nunca estava às “moscas”, pois nós os naturais cá da Costa era lá que passávamos a maioria dos nossos serões agarrados ao varões dos matraquilhos em jogos de grande emoção. Belos tempos esses!!!

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