Câmara Quer Transpraia

Vai voltar ao centro da Costa e, quem sabe, um dia chegará à Trafaria. Mas há muitos “mas” e “ses” neste processo em que a Câmara Municipal de Almada está compradora do Transpraia, contudo sem ainda ter encontrado um entendimento com os proprietários.

 “O comboiozinho” celebrou, nos finais deste junho, 59 primaveras (e verões) a percorrer os oito quilómetros de praias da Costa da Caparica à Fonte da Telha.

António Pinto Silva (APS), proprietário do Transpraia, é sensível à nostalgia do tal período áureo em que reinava nos areais, ligando a Fonte da Telha ao centro da Costa da Caparica, servindo os densos parques de campismo. “Era a forma natural de ir à Costa, às ‘compras’.”  

Em 2009 o CostaPolis empurrou o Transpraia para perto da Praia Nova, bastante a Sul dos Bombeiros, cortando a relação do transporte com o centro da cidade. O projeto previa construir nesse local o interface de todos os transportes, incluindo o Metro, a TST e também o Transpraia. No entanto, como é sabido, o CostaPolis colapsou, tendo o governo de Pedro Passos Coelho, pela mão do Ministério do Ambiente, então dirigido por Assunção Cristas, decidido a liquidação da sociedade até 2014, com apenas dois dos sete Planos de Pormenor terminados. Uma das heranças deste descalabro foi o impacto no comboio, amputado da ligação ao centro e com o terminal desgarrado e escondido que, conforme se queixa Pinto Silva, “não se vê; muita gente pensa até que acabou, que já não há comboio…”

“Desde 2009 o negócio caiu para um terço do seu volume”, revela o proprietário. É a partir desta data que têm surgido regularmente notícias da possível venda do Transpraia, seja para o estrangeiro (Barcelona, Cabo Verde) seja para outros destinos em território nacional. Já em 2012, perante as notícias alarmantes da venda e remoção do “comboiozinho”, gerou-se o movimento público Salvar o Transpraia, ao qual a Gandaia esteve associada. Fez-se uma Assembleia Popular, no Auditório Costa da Caparica, um abaixo assinado, uma exposição fotográfica… Exigiu-se o regresso do Transpraia ao centro da Costa. Todas as forças políticas do concelho concordaram na necessidade de “salvar o Transpraia” e Joaquim Judas, que um ano depois seria eleito Presidente da Câmara de Almada, manifestou publicamente o seu apoio e envolvimento, prometendo o regresso do terminal ao centro. Na altura foram também confirmadas negociações com a CarrisTour, porém tudo continuou na mesma.

Todavia, em todas as épocas balneares, o Transpraia volta ao seu percurso, oferecendo uma experiência única de transporte pela beira mar, uma originalidade flagrantemente desperdiçada pelo turismo local, mas assinalada no TripAdvisor. Curiosamente anuncia sempre o mesmo percurso, que mantém a partida no antigo Terminal, desativado, no centro, mesmo ao fim da Rua dos Pescadores, há anos com a inexplicável indicação de paragem onde se lê “Teleférico da Aroeira – Paragem Inexistente”, até chegar ao remanso da Fonte da Telha por 8,50€ ida e volta.

800 mil euros atrapalham venda

A negociação entre a Câmara e os proprietários do Transpaia iniciou-se, soube o Notícias da Gandaia, pouco depois deste executivo tomar posse. Diz António Pinto Silva: “Reunimos, projetaram-se obras de melhoramento, muitos planos foram explicados, mas acabaram por me pedir para apresentar uma proposta. Eu achei estranho, costumam ser os compradores a fazerem uma proposta e os proprietários aceitam ou não. Falei com a família e apresentámos o nosso número: um milhão e 400 mil euros.”

Pinto Silva respira fundo depois de revelar a quantia, e acrescenta: “o Transpraia é muita coisa, máquinas, carris, a marca… muita coisa. Foi esse o número a que chegámos e foi isso que apresentámos.” A CMA não aceitou, “e também não fez as obras de melhoramentos que tinha referido na reunião inicial”, queixa-se. “Houve outra reunião, desta vez com a ECALMA. Eu convoquei os meus familiares para falarmos sobre este assunto e a contraproposta da Câmara era de 200 mil euros. Claro que recusámos.” O que justifica com os custos, o material…, as agruras do negócio, atalhando logo de seguida dizendo que tem mantido negociações para venda, incluindo para o estrangeiro, o que implica a remoção e deslocação dos carris, composições, máquinas, etc. “Na verdade, essa hipótese ainda não está descartada”, confidencia António Pinto Silva, “quer para outro local em Portugal, quer para o estrangeiro, tenho propostas em cima da mesa.”

A Câmara quer, mas…

A ECALMA, que segundo o proprietário tem conduzido as negociações, questionada pelo Notícias da Gandaia sobre os passos dados no sentido da aquisição, afirma de forma clara e inequívoca, embora não respondendo à pergunta, “Mantemos, no cumprimento da missão que nos foi atribuída, conversações constantes com os vários operadores de transportes do Concelho de Almada. O diálogo permanente visa a promoção de uma nova mobilidade, mais amiga do ambiente e mais eficaz no serviço à população.”

Apesar do silêncio da empresa, fontes conhecedoras do processo disseram ao nosso jornal que a CMA está de facto interessada em comprar o Transpraia, mas que nunca irá chegar aos valores “estratosféricos” apresentados. E enquanto as negociações decorrem, foram solicitadas avaliações para avaliar o valor real da empresa. Certo é, de acordo com todas as fontes consultadas pelo Notícias da Gandaia, o desejo e a vontade de integrar ”o comboiozinho” no sistema de transportes da Área Metropolitana de Lisboa, assim integrando a rede coberta pelo Passe Único. Aliás, todos os testemunhos coincidem, não só no regresso ao centro da Costa, como na sua expansão até à Trafaria. E certo é que caso a compra pela autarquia se concretize, todo o Transpraia irá ser revisto, especialmente numa rigorosa e necessária adequação ambiental, que ofereça sustentabilidade e segurança.

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