Na diferença… a igualdade

mundoEla sabia bem que a sua maneira de vestir, bastante atrevida e muito pouco convencional, fazia com que por um lado as mulheres tivessem duas reações, a primeira era de acharem-na uma pessoa muito pouco respeitável, segundo os padrões ainda vigentes nestes tempos, onde se apregoa tanto a igualdade na diferença, outra reação, era a de se sentirem ameaçadas em relação aos seus namorados, companheiros ou maridos, como se o fato de se vestir de uma forma arrojada, fosse uma espécie de tabuleta, onde se lia a palavra pêga e perigosa, por outro lado ainda, havia no íntimo delas, ainda que jamais o confessassem, um desejo de conseguirem fazer o mesmo mandando às urtigas o diz-que-disse, mas esse acabava sempre por falar mais alto. e então nada melhor que, através de um olhar de escárnio e comentários segredados com a mão na boca para as amigas, com quem conversavam numa mesa de café ou na fila dos supermercados a enumerarem as partes do corpo dessa mulher que achavam imperfeitos e depois partiam para o titulo do catálogo que lhe atribuíam num ápice.

Os homens esses não a olhavam de alto a baixo, admirando-lhe a ousadia, as curvas acentuadas pela roupa, os peitos meio descobertos em decotes generosos e as pernas que ela mostrava sem pudor, em micro saias ou mini calções, raramente lhe viam os olhos e muito menos a alma ou coração, ela era para eles carne, num parque de diversões, onde podiam despir a vestimenta da sobriedade, do estatuto social e trazer à tona o macho irracional que os habitava, num regalo de pecado sem castigo, porque possuir o corpo de uma mulher assim, sem lhe tocarem no íntimo, nem querendo ver para além da cobertura, não era pecado, afinal ela era como Maria Madalena (estava mesmo a pedi-las) e chegavam-se com falinhas mansas, inventando situações, tanto financeiras, como de compromisso legal ou emocional, tentando levantar-lhe o ego, afirmando com olhos de lobo salivante, o quão era linda e serem eles o que ela tanto procurava, outros limitavam-se a ser somente indecentes no palavreado que aplicavam, ao vê-la passar ataviada de muita ousadia exterior,

Dizer que ela não se importava com os rótulos a que a sujeitavam, sem nunca lhe terem dirigido uma palavra, nem lhe conhecerem o íntimo era mentira, ela importava-se e muito, mas tinha nascido com alguma rebeldia, com muita irreverência e desde cedo revoltada com os tabus que lhe impingiam das famosas frases ( se não queres ser monge não lhe vistas o hábito) ou ( diz-me o que vestes dir-te-ei quem és) com uma atração fatal pela cor, pela liberdade de tecidos e cortes, onde o diferente e original era o que mais a atraia, sem mesmo saber porquê, era assim e pronto, sempre tinha sido e nada tinha mudado com a idade, impossível imaginar-se a vestir saias compridas e negras, blusas de folhos junto ao pescoço, meias de lã grosseira e sapatos desprovidos de algum toque de magia.

Viu-se muitas vezes num dilema entre, agradar a gregos e a troianos para se sentir respeitada e darem valor ao que era na essência, ou ignorar e seguir com a sua quase extravagância, tentando engolir as lágrimas que a assolavam, quando se sentia relegada para a condição de uma pobre mulher sem tino, decência ou moral ou pior para uma simples pega contagiosa.

Uma coisa a vida lhe tinha duramente ensinado, era que muitas vezes, as e os, que primeiramente a tinham olhado, com muitas reticências e mais tarde a conheceram melhor, tinham ficado grandes amigos dela sem peias, os outros, bem, esses ela tinha chegado à conclusão que não interessavam, eram simplesmente pessoas pobres de espírito, com os horizontes limitados e sonhos amortalhados e ela gostava mesmo era de visionários, bem humorados, pensadores, questionantes, homens e mulheres que bebiam dos livros a educação e através deles viajavam e aprendiam, que olhavam as estrelas tentando decifrar o universo e mais além, concentrados em melhorar o mundo, dando algo de si, virados para os verdadeiros valores, que são a amizade, o amor, a compreensão e tolerância, sabendo muito e achando sempre que nada sabiam e aquelas que mesmo pouco instruídas, olhavam para o seu semelhante com olhos de ver lá dentro onde mora a verdadeira humanidade.

E assim vivia atraindo e escandalizando os de mente fechada, sempre achando que num campo de joio sempre se encontra uma espiga madura, no restolho pulula vida e na lama sobrevive sempre algo que mexe e respira.

E ela, mesmo que chorasse no seu quarto de paredes brancas, candeeiro de ráfia cama de solteiro, almofada sem ocupante e o corpo esfriado pela falta daquele que um dia chegaria, sabia que continuaria a ser aquela criança – adolescente, rebelde, irreverente e pouco convencional, com o mesmo olhar de sempre, olhando para dentro de tudo o que mexia neste mundo, onde tinha nascido mulher, com curiosidade, emoção, paixão, bebendo de tudo e todos a força da vida numa aprendizagem sem ponto final.

accleme

Designer Gráfico

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