Entomologia
Virgílio Ferreira
Cada vez que, com a folha de papel na frente, tento escrever algo que tenha interesse para os meus leitores, as palavras nem sempre surgem. Talvez o tema escolhido não seja o mais indicado? Ou será uma “branca” que me apanhou e que me limita o encadear das palavras? Vou tentar, mais uma vez, sem ter de amarrotar a folha de papel e atirá-la para o caixote do lixo (para reciclar).
Volto de novo ao tema com que, há dois anos e meio, iniciei a minha colaboração neste jornal: a entomologia. Os insectos e o seu estudo que, assim como a tauromaquia e a família, são amores da minha Vida. O Alentejo, esse, é a minha própria Alma. Vou assim falar-vos de alguns desses seres minúsculos, alguns com apenas alguns milímetros, que povoam a Terra. São conhecidos alguns milhões de espécies. Muitos mais milhões há que descobrir!!! Vem isto a propósito de duas novas espécies, que foram estudadas e determinadas agora, e que foram capturadas neste nosso querido Norte Alentejo. Uma delas, o Athous (Neonomopleus) zuzartei capturada em Cabeço de Vide e em Monforte e, a outra, o Athous (Neonomopleus) recaldei, na freguesia de Escusa, no concelho de Marvão, em pleno Parque Natural da Serra de S. Mamede. Pertencem a uma família de insectos, a Elateridae, da qual não sou especialista. Foi um colega amigo, espanhol de Albacete, o António Sanchez Ruiz, em conjunto com, o também colega José Luís Zapata de la Vega, que realizaram o seu estudo, que foi posteriormente publicado numa revista de entomologia, o Boletin de la SEA (Sociedad Entomológica Aragoneza) de Saragoça, da qual somos associados. Agradeço ao colega Sanchez Ruiz ter-me dedicado uma dessas espécies.
O que nos leva isto a pensar? Que, aqui em Portugal, como em toda a Europa, onde os estudos da fauna entomológica estão mais avançados que noutras grandes regiões do mundo, ainda há muitas espécies novas, por descobrir e, o seu estudo, difícil para alguns grupos mais complexos, e com poucos especialistas, ainda nos trazem muitas novidades. Mesmo nas famílias mais estudadas, todos os anos surgem espécies novas para a ciência. Para que muitos desses seres vivos não desapareçam, e se extingam sem terem sido conhecidos, é necessário proteger a Natureza e não destruir os habitats onde eles estão implantados. Quase todos estão associados à flora existente, que, como a fauna, também tem que ser objecto de protecção, sem os radicalismos exagerados como acontece na vizinha Espanha. A protecção radical, sem permitir a colheita de material entomológico para estudo, não leva a lado nenhum. Só prejudica o avanço dos conhecimentos.
Os desequilíbrios ambientais, provocados pelo Homem – o maior predador da Natureza – são, todos os dias, a causa da extinção de muitos seres vivos. José Jorge Letria escreveu na “Vida Ribatejana” de 12 de Janeiro de 2005 “É dramático verificar a falta de respeito que os habitantes das grandes metrópoles contemporâneas têm pela Natureza e pelos ecossistemas. A relação entre o Homem e o mundo natural é conflituosa e agressiva, não respeitando regras, princípios ou limites. É como se a Natureza apenas existisse para servir o ser humano e para se manter passiva ante o seu egoísmo e a sua vocação consumista. Nada mais errado. Nada mais enganador. Sempre que se destroem, por ambição e cobiça, milhares de hectares de floresta, estamos a cavar, a médio prazo, a sepultura em que havemos de nos deitar…”
Na altura, em que escrevo este crónica, tenho comigo um casal de espanhóis, a Lucía Arnaiz Ruiz e o Pablo Bercedo Páramo, estes de Léon, lá do Norte da Espanha, que estão a adorar este cantinho do Alentejo, quente mas limpo e cuidado, que visitaram pela primeira vez. Ambos são especialistas noutras famílias de insectos e colegas e amigos já de há alguns anos. Como estudamos grupos comuns, temos colaborado na publicação de alguns trabalhos sobre a fauna ibérica e, tenho tido da sua parte uma ajuda, sempre desinteressada, no estudo e posterior publicação de trabalhos conjuntos. A partilha de conhecimentos e a conjugação de esforços é uma forma sempre útil para o progresso da ciência. Tudo procuraremos fazer para dar a conhecer este imenso e fascinante Mundo dos Insectos, que vivemos com paixão.
Hoje fico por aqui! Espero que a falta de civismo e a cegueira dos Homens, não continuem a destruir a Terra que temos obrigação de proteger.
Consegui chegar ao fim desta crónica. Eu, como dizia o escritor Virgílio Ferreira, também “ Preciso de escrever…”
Nota: Esta crónica foi publicada em Julho de 2005 no jornal “Noticias de Arronches”. A foto é do Athous (Neonomopleus) zuzartei.
António José Zuzarte, Costa da Caparica, Junho de 2017.