Retratos da China na Costa da Caparica
É inquestionável a expansão das lojas chinesas em Portugal. A Costa da Caparica não é excepção. Foi numa pequena loja da Rua dos Pescadores, aberta desde 2011, que fomos conhecer Ana Wang, de 34 anos, e a sua família. Embora tenha nascido em Lisboa, foi para China com apenas um mês, cresceu em Xangai e já só regressou 12 anos depois. Na altura a integração na escola e na cultura portuguesa foi um processo muito difícil.
O mesmo não se passou com a sua filha, Catarina Alves, de 16 anos, que nasceu cá e frequenta uma escola portuguesa, a sua 1ª língua e a falada em casa. Catarina vai agora começar a aprender mandarim na Escola Chinesa, nos Anjos, pois Ana considera que a nível profissional a China é a potência do futuro, e até do presente. O passo seguinte é a frequência de um curso intensivo de chinês, no Verão, desta vez na China, país onde já teve o prazer de ir algumas vezes. Quem também se interessa muito pela cultura que lhe foi “emprestada” é Jorge Alves, 42 anos, marido de Ana.
Os pais de Ana, actualmente divorciados, viveram em Portugal, embora com a reforma tenham optado por regressar ao seu país. Os avós, retornados de Angola, tinham como objectivo a América, mas sem autorização para entrar, acabaram por se fixar em Portugal. Ana tem ainda um irmão, nascido em Espanha, que também se fixou em Portugal.
O regresso à China é uma hipótese, mas só num futuro longínquo. Ana gostava, mas agora a sua prioridade são os estudos da filha e as suas amizades de adolescente. Enquanto isso não acontecer, têm sempre o ano novo chinês, que continuam a celebrar, a superstição de certos símbolos – na passagem de ano comem peixe para ter sempre comida, raviolis para ter dinheiro e almôndegas para a família ser feliz e unida – e o contacto com a comunidade chinesa. Em casa, as refeições não se resumem a comida chinesa, vale tudo. Embora não faça parte da tradição chinesa, Ana e a sua família já se renderam a festejar também o Natal e o Ano Novo português.
Nesta dualidade de culturas, Ana acredita que há pouca informação sobre a China e que muitas vezes a imagem que passa não é mais real, embora as pessoas não o queiram entender. Considera inclusive que o governo chinês, neste momento, faz mais pelo seu povo do que o Estado português.
Ana Wang considera os portugueses um povo simpático e acolhedor, embora reconheça que ao nível empresarial existe uma grande diferença, os portugueses são mais desconfiados e individualistas, não embarcam em negócios com a facilidade que caracteriza o seu povo.
A variedade e o preço são os requisitos que levam tantos portugueses às lojas chinesas, e Ana garante que não há concorrência entre pares, pois há espaço para lojas como a dela, a que chama “formiga” e para os “tubarões”, lojas maiores, como a que visitámos de seguida.
No Círculo Feliz, na Praça da Liberdade, encontramos a 2ª família, de Ye Zhang Miao, 35 anos, e do seu marido, Yin Hai San. Ye Zhang Miao está há 11 anos em Portugal. O seu ainda namorado, na altura, veio à frente e Zhang um ano depois. Começaram por trabalhar num restaurante chinês, durante cerca de três anos, até terem possibilidade de abrir o seu próprio negócio, a 1ª loja chinesa na Costa da Caparica.
O seu círculo feliz familiar completa-se com 3 filhos, 2 meninas de 10 e 11 anos e um rapaz de 5. Durante a semana têm aulas de português e ao sábado aulas de mandarim na Escola Chinesa. Uma vez que nasceram e cresceram os 3 no nosso país, não é de estranhar que gostem mais de Portugal do que da China, embora já tenham ido lá de visita muitas vezes. Em casa fala-se chinês. Também se come sempre comida chinesa, da cozinha nacional Zhang apenas aprecia cozido à portuguesa.
Zhang aprendeu português de ouvido, nunca recorreu a aulas. Quando chegou, há 11 anos, admite que foi complicado aprender a língua, assim como a integração, até por razões burocráticas como a falta de documentos. E embora actualmente a sua loja tenha 2 pisos cm uma área de cerca de 500m2, Zhang também sentiu o efeito da crise nas vendas e recorda os tempos em que havia mais movimento. O regresso às origens não faz parte dos planos de Ye Zhang Miao para já.
E estes são apenas dois retratos de família de um mundo cada vez mais global.