Naquele Carnaval

Naquele Carnaval…

carnavalComo os anos passaram… Naquele Carnaval, de meados dos anos quarenta, eu e tu, Vasco, meu irmão, éramos duas crianças, tu mascarado de minhota e eu, pela primeira vez, vestido de forcado. A Vida era passada a brincar, sem preocupações, lá no Monte do Cimo d’Aldeia, onde o avô Zé Luís tinha o seu assento de lavoura, onde livres corríamos pelos campos a ver as varas de porcos nos montados ou a cabrada que o avô tinha ou ainda aquela vacada alentejana que, em juntas, lavravam os campos para as sementeiras com os ganhões na rabiça dos arados… Tudo passou depressa demais, e já está lá tão para trás, e não sei o que me leva, agora, a recordar esse passado, já tão distante, e tenho de o fazer sozinho, pois tu, em 21 de Janeiro, deixaste-me só. Partiste para uma viagem que não tem volta… por cá ficaram em dor a tua mulher, o teu filho, as tuas netas e o teu neto e todos nós os teus familiares e amigos. Os Zuzartes a quem ensinaste, como nosso Pai já nos tinha ensinado, os princípios da honra, da honestidade, dos pés bem assentes no chão, não dando os passos maiores que o comprimento das pernas, sem medo de olhar as pessoas nos olhos…sempre assim foste e assim te hei-de recordar sempre.

Na nossa juventude percorremos o colégio de Fronteira, tu ainda estiveste alguns anos no liceu de Portalegre, e depois nas Escolas Agricolas de Santarém e tu ainda na de Évora. A guerra em África levou-te até à Guiné e, logo que regressaste, em 1966, casaste e começaste a trabalhar, tendo abandonado os Forcados de Montemor, onde ainda pegaste três temporadas. Nesse mesmo ano de 1966 o nosso Pai morreu e tu fizeste-te agricultor, nas terras junto à Aldeia de Santo Amaro, onde desenvolveste um projecto de produção de leite, seleccionando e aumentando sempre a vacada melhorando as suas produções…fizeste trabalho meritório neste Alentejo de Invernos rigorosos e Verões escaldantes, durante muitos anos, até que a saúde te permitiu. Foste Homem e honraste os teus compromissos, os teus descendentes terão que seguir o teu exemplo e assim nunca serás esquecido. Fisicamente já não estás entre nós, mas as recordações, a saudade, embora acompanhadas de uma imensa tristeza, estarão sempre perto de todos, nestes lugares que marcaste com a tua presença. Há uns anos passavas muito tempo junto ao mar, onde te sentias melhor, onde podias espraiar a vista pelos areais, pelas ondas, sonhando talvez com esse oceano que te levou e te trouxe das terras de África… sonhavas com a tua juventude, com aquela idade em que somos capazes de fazer tudo, com a esperança de tudo melhorar… mas meu querido irmão, aquele Carnaval de há mais de 70 anos, naquela foto, junto aos madeiros de azinho e sobro, que esperavam ser queimados nas lareiras do Monte para aquecerem os nossos corpos não podem agora aquecer as nossas Almas e manter muito quente, sempre, a nossa Saudade.

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