Outra Papelaria?
Outra papelaria? O que aconteceu? O que poderá acontecer?
– É triste Sofia… É triste… disse eu
– O que foi desta vez? – respondeu, ela preocupada.
– Eles fecharam a papelaria do outro lado da rua. Primeiro não abriram as portas durante uma semana, e agora puseram um papel a dizer “Trespassa-se”.
– É normal, não é?
Sofia estava certa. Era normal. Triste e simplesmente normal que eles tivessem fechado as portas e o negócio, apenas seis meses depois de o terem iniciado.
Este inverno foi muito chuvoso, eu passei a maior parte dele em frente ao ecrã do meu computador, a escrever e a falar com amigos virtuais do Facebook e, sendo um americano que viveu antes numa pequena cidade dos EUA parecida com a Costa da Caparica, onde precisava de conduzir pelo menos dezasseis quilómetros para poder chegar ao posto de gasolina ou à loja de conveniência mais próximos, onde havia algumas coisas disponíveis, foi uma alegria e um paraíso para mim descobrir que ainda existe um local no mundo onde basta atravessar a rua, de fato treino ou calções, para ir à padaria comprar pão, tomar um café da manhã, ou ir ao talho local ou ao mercado para poder cozinhar uma refeição saudável com carne ou peixe e legumes frescos. Vida relaxada duma cidade à beira-mar. E aquela papelaria era o lugar onde eu costumava comprar cigarros, papéis, canetas e pastas de arquivo. Dei-lhes negócio todos os dias, alegremente. O que aconteceu? O que é que correu mal?
Bem… para começar, eles nunca abriam a horas e por vezes às dez da manhã ainda tinham as portas fechadas e à tarde por vezes fechavam às cinco para já não falar da hora de almoço…
Em segundo lugar, eles nunca sorriam, e este é um dos erros mais críticos, talvez um equívoco entre muitos, especialmente na Costa da Caparica e de um modo geral nos pequenos negócios portugueses: para muitos deles, ter um ar profissional significa fazer um ar sério, que por vezes quase que parece infeliz (desculpe, estou muito ocupado para olhar, sorrir ou conversar consigo. O trabalho é muito e não posso perder tempo personalizado com os clientes e sorrir pode parecer que não levo o trabalho a sério).
É preciso ver que a Costa é uma cidade onde estão sempre a chegar turistas para desfrutar do bom tempo e da praia, que pretendem divertir-se e sentir-se relaxados e felizes. É sempre melhor ser positivo e alegre já que as suas reacções podem marcar o dia destas pessoas, a sua opinião sobre o seu negócio e talvez toda a sua experiência sobre a cidade, para já não dizer sobre os portugueses. São simples regras de negócio: os seus clientes gostam que sorria, que seja simpático, que os comece a tratar pelo nome se vierem mais de duas vezes, que se mostre interessado e lhes dê informações úteis e alta qualidade e bons preços. Ser profissional não se trata de se sentir importante ou mostrar um olhar sério. Trata-se de tentar agradar e compreender as necessidades do cliente.
Em terceiro lugar, o que essa papelaria tinha em stock não estava na maioria das vezes ajustado ao mercado e às necessidades dos clientes, e o que as pessoas pediam eles não tinham, forçando-as a ir procurar noutro lugar. Talvez fosse por falta de capital, mas esse aspecto poderia sempre ser solucionado se procurassem novos fornecedores a quem pudessem pagar após a venda dos itens e nalguns casos até mais facilmente quando se tratava por exemplo de uma marca de cigarros específica ou dum jornal especifíco. É sempre prejudicial para um negócio dizer “eu não vendo essa marca ou não tenho nem vou ter”, quanto mais de um cliente que procura por esse artigo mais de duas vezes.
Quarto: havia mais duas papelarias e dois quiosques na mesma rua, e mais duas lojas chinesas a curta distância, que vendiam o mesmo tipo de artigos, por vezes com mais escolha e/ou a melhores preços. Será que não fazem estudos de mercado e que não sabem avaliar o peso da competição como um factor essencial nos negócios? Ou será que não procuram novas ideias? Este último aspecto é de facto, a meu ver, o ponto fulcral da questão… precisa de provas? Conte quantos cafés, cabeleireiros, restaurantes ou lojas de informática, telemóveis ou óculos escuros consegue encontrar apenas a uns metros uns dos outros. Mais que as mães, não é? Agora tente encontrar um negócio que tenha uma ideia original ou que venda artigos ou forneça um serviço que mais ninguém tenha. Onde? Onde? Acho que já percebeu a ideia. Não vamos falar de crise agora. Vamos falar da vergonha que isto é para um país que um dia decidiu explorar oceanos desconhecidos enquanto todos os outros povos ficaram em terra, apenas para encontrar novas possibilidades, novos terrenos e novos negócios.
Bem… alguns meses mais tarde… outro café tomou o lugar da papelaria fechada, abrindo mais um café ao lado de outros cinco, e quando me encontrei com o antigo proprietário da papelaria, após o encerramento, ele apenas se queixou de ter perdido todo o seu capital no negócio devido ao mau estado actual da economia.
Agora, antes das grandes multinacionais chegarem e limparem todos os honestos, esperançosos e sem plano pequenos comerciantes das ruas da Costa da Caparica, antes que as grandes empresas nos façam ficar na fila no supermercado ou andar alguns quilómetros para lá chegar só porque estão a capitalizar dinheiro para os seus accionistas ou para abrir mais uma loja e dar mais dinheiro àqueles que já têm muito, talvez devessemos aproveitar a oportunidade para reflectir, avisar e pedir a atenção para algumas dicas: pensem e procurem ideias inovadoras, pesquisem na internet todas as outras ideias que se podem encontrar pelo mundo fora para a abertura de novos negócios em lindas cidades turísticas como a Costa da Caparica.
Aguardem pelo meu próximo artigo e verão como, em apenas alguns dias, é possível descobrir e apresentar dez negócios inovadores, únicos e sem concorrência local, que poderão tornar-se muito rentáveis mesmo começando com baixo capital e que, apesar de continuarem a dar provas de funcionarem muito bem noutros locais do mundo, não sei bem porquê, nunca ninguém pensou em fazer na Costa da Caparica.
Kamel Khairalla e Sofia Vilar de Azevedo
Costa da Caparica, Março de 2014
excelente artigo Kamel & Sofia, puseram-me água na boca, portanto… venha o próximo!
abraço