Um Dia em África
O sol, deus da luz e do calor, emerge do seu leito nocturno como uma enorme bola de fogo.
Avermelha o horizonte distante e os sons inconfundíveis do amanhecer africano vão-se misturando com o colorido morno da paisagem nascente.
Nesta terra de magia constante, terra sofrida e bela, a vida começa mais uma vez a sua rotina milenar e o povo, consciente da grandeza da sua cultura e da sua sabedoria, procura água numa fonte antiga.
O sol, na sua eterna migração, atinge o ponto mais alto no céu e a terra resseca. Do solo sobem intermináveis ondas de calor e é nesse momento que o povo sente com mais intensidade o peso da opressão. A pele nua das gentes negras queima sob o sol impiedoso, como se a mão armada do verdugo, numa cadência exasperante, desferisse violentas chicotadas punitivas.
Porém, mais tarde, no tumultuoso poente, quando a paisagem desaparece em confundidas sombras com a erosão progressiva das cores, e os corpos se libertam do torpor vespertino adquirindo um ritmo único, toda a magia africana aflora numa simbiose perfeita entre a Natureza e o Homem.
É nesse momento surpreendente – quando a luz ainda não sucumbiu à força avassaladora das trevas e em que a inquietude se transforma em reflexão – que os homens olham o poente sem o ver.
Quando a profunda noite cai, misteriosa, e os sons dos animais nocturnos se fazem ouvir no grande silêncio, as gentes reúnem-se à volta das fogueiras. Conversam, comem, bebem e riem e, espontaneamente, deixam que seus corpos evoluam em frenéticas danças da fertilidade e do amor.
É o momento sublime em que os espíritos da noite os visitam e eles caminham, finalmente livres, pelas extensas savanas de outras dimensões.
Depois, cansados, adormecem felizes no regaço quente da Mamã África que, carinhosamente, os embalará até ao próximo amanhecer.
Reinaldo Ribeiro
04OUT2010
Grande poema companheiro e amigo. A paixão pela África toca-nos aos dois. Mesmo nunca lá vivendo sinto uma atracção estranha por esse Mundo e pelas suas gentes.