Eleições Autárquicas: É Preciso Compreender os Números

350Já se sabe que as festas de quem venceu irão ser efusivas, tal como a tristeza de quem perdeu será dura de digerir. Porém, estas eleições trazem muito mais informação do que as contas de ganhar e perder. Se essa mensagem não for compreendida, os partidos arriscam-se a ir de surpresa em surpresa e Portugal ficar com uma sociedade (cada vez mais) desestruturada.

A Costa da Caparica mudou de gestão, após um longo reinado do PSD e, especialmente, quatro mandatos de António Neves. José Ricardo Martins, do PS, que concorria pela terceira vez, ganhou finalmente a Presidência da Junta, garantindo 6 mandatos, ficando à beira da maioria absoluta. O PSD foi punido pelo desgaste dos mandatos anteriores e em especial pelo voto de crítica ao Governo, passando para 3 eleitos, a CDU aumenta para 3 eleitos, acompanhando os bons resultados desta força partidária em todo o concelho, O CDS, que perdeu o seu mandato por faltas repetidas à Assembleia de Freguesia, foi punido perdendo centenas de votos e, finalmente, tomando o seu lugar, a Lista Independente elege um deputado, aquele que fora perdido pelo CDS.

Porém, as coisas, apesar de parecerem, estão longe de ser tão simples e lineares.

O PS ganha a Junta com apenas mais 112 votos do que em 2009, passando de 30,47% para 36,6% e obtendo mais um mandato.

Por sua vez, o PSD – o grande derrotado – perdeu 679 votos em relação ao que obteve em 2009. Naturalmente, haverá quem atribua esta diferença à saída de António Neves, mas, uma vez que foi ele o candidato à Câmara, se analisarmos os votos que obteve cá na Costa da Caparica, verificamos que não estão longe dos obtidos para a Junta, apenas mais 102 votos, ou seja, menos 577 do que obtivera em 2009. Parece evidente a intervenção dos fatores que referimos atrás: cartão vermelho ao governo e cansaço de quatro mandatos. Como resultado, o PSD passa agora a ter apenas 3 mandatos na Costa da Caparica.

Relativamente à CDU, tem menos votos, obteve 841 em 2009 e apenas 790 nestas eleições, mas tem mais um mandato – agora 3 – passando de 15,58% para 16,48%.

O CDS/PP foi severamente penalizado, passando de 471 votos para apenas 119. Será que a causa foi a péssima prestação do seu eleito, que perdeu o mandato por faltas? Será que foi por penalização pela participação deste partido no governo? Será que foi uma má escolha da candidata, profissionalmente ligada à agricultura, mas em Castelo Branco, que não conseguiu desenvolver uma relação efetiva com os agricultores das Terras da Costa, o bastião concreto daquela força partidária na freguesia? Ou será que se trata do fim da relação com o pai do candidato anterior – um médico muito prestigiado da terra? Nunca o saberemos.

A Lista Independente, que garantiu um mandato com 505 votos, só pode ser considerada vencedora e por muitas razões. Mesmo muitas. Não só pela clara desvantagem pela ausência das máquinas partidárias e dos respetivos orçamentos, muito evidente especialmente na comparação das campanhas dos dois partidos de governo, PS e PSD.

Mas não é só isso, que não é pouco. A verdade é que os independentes passarão a ser o fiel da balança e aqueles que irão desempatar as votações entre os seis mandatos do PS e os 3+3 da oposição do PSD e CDU. Os Independentes ganharam um papel de charneira que terá todo o relevo no futuro, assim eles consigam posicionar-se com personalidade e sensibilidade política.

Ora como se pode ver, a aritmética parece não bater certa, com os votos perdidos por uns e ganho por outros, nem com a dimensão das vitórias tendo em conta o número dos votos obtidos. A explicação tem dois fatores, sendo o primeiro, naturalmente, a abstenção. Em 2009 estavam 10861 inscritos e apenas votaram 5399 eleitores, uma taxa de abstenção de 50,29%. Nestas eleições o número de inscritos aumentou para 11318, mas apenas votaram 4793, ainda menos do que em 2009, ou seja, menos 606 votantes, apesar do aumento dos inscritos. Estes números não se podem pessoalizar diretamente, não se podendo inferir que este número de pessoas deixou de votar aqui ou ali pois as mudanças de residência, etc. imprimem diferenças no eleitorado que, uns deixaram de votar aqui,outros passaram a fazê-lo e, apesar de estarem expressas em números gerais, estes podem não coincidir com as mesmas pessoas.

Finalmente, o dado que teve uma expressão extraordinária e deve ser tido em conta por todas as forças políticas, não só pelas alterações que provocou, mas especialmente pelo seu significado profundo e naquilo que poderá determinar em mudanças futuras: referimo-nos às mudanças nos votos em branco e votos nulos, os quais mais que duplicaram e podiam ter protagonizado uma mudança muito substancial na distribuição dos mandatos.

Em 2009 registaram-se 85 votos em branco e 76 nulos, somando 161. Porém, nestas eleições, registaram-se 158 votos em branco e 167 votos nulos, ou seja, um total de 325, pouco mais do dobro. O aumento da abstenção, especialmente num dia de chuva, terá a leitura do costume, mas não se pode confundir com o aumento substancial dos eleitores que fizeram questão de se deslocar à boca das urnas para exprimirem o seu desagrado com o regime no seu todo.

Tendo em conta os votos na freguesia para a Câmara, ainda há mais brancos (198) mas menos 5 nulos (162). O PS continuou a ser vencedor com mais 55 votos, António Neves, do PSD fica em segundo lugar,mas com menos votos, como atrás referimos; a CDU fica em terceiro mas perdendo 344 votos; o CDS perde mais de metade dos seus votos,passando de 398 para apenas 156; o Bloco de Esquerda, igualmente perde nos votos e nas percentagens, mas sobe para a quarta posição: de 342 em 2009 (6,33%) passa para 259 (5,41%).

No total do concelho e quando falta ainda apurar os votos da freguesia da Charneca e Sobreda, pode-se desde já assinalar que tudo indica uma vitória da CDU. Porém, mais uma vez, os votos em branco e nulos têm uma dimensão que nos obriga a refletir: de 2115 em 2009,passam agora a 5861, mais do dobro. A nível nacional, a mesma tendência: de 158 544 para 329 924.

Os votos em branco e nulos podiam ter mudado dramaticamente os resultados. Para quem não for capaz de perceber que são em si já uma mudança mas que ainda não encontrou a sua expressão mais clara e substancial, não compreendeu os resultados destas eleições.

Notícias da Gandaia

Jornal da Associação Gandaia

One thought on “Eleições Autárquicas: É Preciso Compreender os Números

  • 4 de Outubro, 2013 at 22:24
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    Comentar o resultado eleitoral na nossa freguesia corresponde ao meu lamento pessoal por não ter conseguido passar a mensagem do voto útil e justa na força politica CDU que a grande maioria dos Almadenses também acreditaram: escrevi «preto no branco» que os partidos que governaram o País nos últimos 10 anos prejudicaram a Costa da Caparica em muitos milhões de euros, depois de assinarem contratos programa de investimentos com a CMA-CDU, constituindo-se em empresa de capital misto 60% governo 40% CMA, em 2001 de nome CotaPolis mesmo antes da crise «que serve para abafar tudo» os Governos PS e PSD-CDS não honraram os compromissos do estado de direito que representaram.
    Pergunto-me o que é que falhou no meu empenho junto dos meus colegas pequenos empresários e eleitores em geral que, como eu estão descontentes pela degradação e falta de investimento local. Dezenas de cidades em Portugal beneficiaram de muitos milhões de euros de fundos comunitários.
    Mesmo assim na Costa da Caparica os adversários políticos conseguiram com êxito, descarregar o descontentamento do eleitorado na CDU e premiar injustamente as forças politicas que sendo locais estão obviamente sintonizadas com o poder central. Fica o apelo para que eu seja desmentido no decurso dos próximos 4 anos e que o investimento em dívida chegue finalmente.

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